Foto: Camila Márdila (tirada do perfil de Facebook do "Coletivo transverso")
O tempo congelado
O homem
solitário, entristecido, sentado em um bar. Ele escreve por escrever. Como
forma de passar um tempo que não passa. Preenche folhas em branco, com margens
amareladas. Escreve em um caderno antigo, encontrado por acidente em uma
gaveta. Queria ser escritor, mas nunca superou a falta do que dizer. São
palavras que não têm razão pra ser, exceto ocupar o vácuo entre os momentos.
São pedidos de socorro.
Bebe sem
vontade, fuma sem tesão. Sente-se em uma dimensão paralela; estranha e familiar
ao mesmo tempo. O ambiente é o mesmo, assim como as pessoas que passam à sua
frente. Tudo é igual. Exceto ele, que não está mais lá. Está em uma cabine
transparente, hermeticamente fechada, observando tudo. São seres desfilando em
um aquário, o mundo lá fora. Ele está "lá", ausente. Percebe que não
pode se mover. Que todos os momentos se resumem a um instante estático. Uma
vida inteira resumida em um olhar perdido, um sorriso torto e a pele oleosa,
formando um desenho quase expressionista. Ao fim, todos somos caricaturas,
moldadas por nós mesmos e nossos desastres. Um retrato a tinta e recorte. Não
há o que dizer, pois o discurso foi sugado. Abre os olhos e se percebe como uma
fotografia de uma página em branco, com manchas amareladas. Um simulacro de
criação, estéril em sua concepção. Este tempo não andará. A morte é um lago
parado. Para de escrever.
Gostei muito! Parabéns! O texto é singelo e bem escrito, merecia muitos votos no clube da leitura. Espero que tenha sido bem lido lá na hora...
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