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sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014

Crônica: Um calor do caralho!



Um calor do caralho!

 

We can't stop here! This is bat country!
Hunter S. Thompson

O clima esquentou, não há dúvidas. Nas ruas, indiferentes avaliadores de temperatura estampam 50º e há cheiro de sangue. Misturado com urina, pimenta, carne e lágrimas. Wander Wildner esteve no sebo Baratos da Ribeiro e cantou "Um lugar do caralho". Se ele vivesse nesta cidade, adaptaria a letra para "Um calor do caralho!" A menina sentada em uma mesa ao lado da minha no bar define: "Um calor dú ca - ce - tí !" Eu não sei. Fico com caralho mesmo. Afinal, desde o começo de 2014 sinto que estamos todos tomando no cu, metaforicamente falando. Bom, alguns não.
A morte brutal do cinegrafista, atingido por um rojão, encerrou a fase romântica das manifestações. Deu-se início a uma era de prata, cuja perspectiva conserva somente a coloração do metal, e nada de sua preciosidade. As redes sociais, após uma longa convivência pacífica de tofu, se tornaram as arenas de MMA para que foram originalmente planejadas. À distância, os combatentes tiram as luvas e travam um confronto post a poste.
A situação seria engraçada se não fosse tão Kafka de ressaca às 7h da manhã de uma segunda-feira. E, é claro, acordando com este clima que, se não nos matar, nos transformará em mutantes. Prevejo que em breve poderei ler no escuro.
Estou na Casa Porto, um sobrado na Zona Portuária, e uruguaios cantam Cartola. São bons, e o ligeiro sotaque dá ao show um leve toque de experiência antropológica. O ar condicionado do local ajuda a reorganizar as ideias. Isto, e as doses de Heineken e Budweiser, cervejas sem milho. Suponho. O embaralhamento da mente auxilia em uma ordem caótica de paz artificial. Também serve à adjetivação inescrupulosa que é uma beleza.
Estalo os ossos e, em um lugar distante e desencantado, o reino da Central do Brasil, o chicote deve estalar no momento. É um filme velho, com gente correndo em meio a nuvens tóxicas e nervosas. Não acompanho em tempo real à manifestação que ocorre. A mente, travesti violento, me sacode.
As pessoas que estão lá, cuja definição depende da filiação alheia, foram gritar contra os abusos sucessivos do estado. De novo, a definição do estado é feita de acordo com quem você fala. "A gente morre sem querer morrer", canta meu amigo brasileiro de olhos azuis. Mais uma vez, a política invade no quebra quebra, em forma de música de protesto. É impossível viver no Rio de Janeiro de fevereiro de 2014 sem estar emergido em caos político. A máxima de Antônio Conselheiro se tornou realidade.
Ai de nós, admirados de sabiá! As aves que aqui gorjeiam não vandalizam como lá! Temos 10 mortos, "vândalos" de todas as  formas, tamanhos e interesses, uns picadeiros de guerra civil e nenhuma solução. Se sobrevivermos até a copa, será um espetáculo e tanto. Pouco provável que tenha futebol, com exceção do Fla - Flu ideológico.
Os inimigos se multiplicam como marcas de merda de pombo no chão. Depois de fevereiro, nem todos curtirão as postagens do vizinho como antes. Com exceção (esta palavra na moda) se for a respeito deste calor do caralho cacete tenso! Prestes a enrabar. O clima fritou os miolos de todos nós. Chove, porra!

domingo, 30 de setembro de 2012

O futuro segundo o delegado e o urso

Eu não vi o filme “Ted” ainda, mas posso afirmar que já ri com ele. Indiretamente, pelo menos. Para os desatualizados, nesta terça-feira, 25 de setembro, o deputado Protógenes Queiroz afirmou que pedirá aos Ministérios da Justiça e da Cultura que suspendam a exibição de “Ted”. O filme trata da amizade entre um sujeito sem rumo e seu ursinho de pelúcia, que não apenas fala como possui toda uma miríade de vícios humanos: bebe, fuma, usa drogas e é tarado. A classificação etária é 16 anos, mas Queiroz levou seu filho de 11 anos para assistir ao filme sob a alegação de que o menino é um pré-adolescente. A indignação do político não é de que o filme seria inapropriado para menores de idade, mas para todos. “Não poderia ser liberado nem para 16 nem para 18 anos. Esse filme não pode ser liberado para idade nenhuma. Não deve ser veiculado em cinemas", comentou em reportagem ao “Estado de S. Paulo”. É quase como a versão bufa da polêmica no ano passado envolvendo o infame “Um filme sérvio” e o grupo liderado por Cesar Maia, candidato a vereador nestas eleições. Ao contrário dos políticos cariocas, dou a Queiroz ao menos crédito de ter visto o filme antes de criticá-lo. Sobram piadas e críticas a Queiroz nas redes sociais. Muito provavelmente a bilheteria do filme será maior devido ao novo público de curiosos que irá ao cinema. E, mais ainda, atrairá apenas fumaça e nenhum fogo. Trata-se de um bom exemplo de opereta da era virtual: é uma encenação despretensiosa, cujo intuito final é distrair o espectador com certa leveza, sem oferecer algo mais substancial, realizado em um palco invisível e em movimento constante, em que o jornalismo divide igual espaço e importância com imagens de gatos e fotos de refeições. Depois de rir com o ridículo da situação, um pensamento me veio. Uma rápida busca na internet me relembrou. O deputado que hoje se preocupa com os efeitos corruptores de um filme sobre um urso de pelúcia maconheiro foi ontem considerado um herói e um mártir nacional. Antes de ser tornar político, ele foi o delegado federal responsável pela Operação Satiagraha, que levou à prisão do banqueiro Daniel Dantas por corrupção ativa. Após ser preso, Dantas foi liberado para ser preso mais uma vez por tentar subornar um delegado da Polícia Federal. Foi liberado no dia seguinte. Queiroz foi demitido da PF e condenado pela Justiça em 2010 por "vazar informações" e "forjar provas". A pena de 4 anos foi convertida em prestação de serviços à comunidade. Com tudo isto, fiquei pensando no efeito do tempo nas pessoas e percepções. O próprio “Ted” tem este assunto em sua premissa. O homem e seu urso de pelúcia viciados e preguiçosos vivem numa adolescência perpétua. Apesar de estarem com idade adulta, não amadureceram e tem dificuldades em encarar a nova realidade de suas vidas, o que origina o comportamento que tanto horrorizou o deputado. Já Queiroz, como diz a expressão, perdeu uma boa oportunidade para ficar calado. Após seu papel de destaque como o “delegado que pegou o corrupto e pagou o preço”, Queiroz sumiu da vida pública para retornar como uma piada de bar, no estilo do humor do filme que critica. Ouvi a música “The future” de Leonard Cohen enquanto escrevia este texto e fiquei pensando em seu profético verso “When they said REPENT REPENT I wonder what they meant” e o associei aos personagens desta farsa midiática. Seja através do entorpecimento ou lutando contra moinhos de vento que posam de gigantes, o tempo pode ser devastador com aqueles que brilharam no passado. O garotinho com o brinquedo especial e o policial herói são personagens da mesma tragicomédia. Aqueles que a todo custo se agarram àquele resquício de esperança e bem-estar, conscientes da ilusão que criaram, mas incapazes de aceitar sua nova condição. Todos nós precisamos nos adaptar às atuais etapas de nossas existências para não sermos esmagados pelo peso. O peso do fracasso, da culpa, do deslocamento. Todas estas sensações nos arrastam à medida que nossa compreensão sobre o que nos cerca some. A vida passa, e passa por cima. É preciso estar ciente que apenas ao se arrepender, ao se desculpar por tudo o que deu errado e seguir adiante, entendemos o que a vida estava tentando dizer. Não adianta viver no passado. Os tempos mudaram. É necessário preservar nossos valores, mas isto não é desculpa para não entender o contexto da nova realidade. Porque o futuro, meu irmão, em qualquer caso, é a morte. O resto é bom senso. Em tempo: No dia seguinte, o deputado voltou atrás devido a repercussão da história. Ele agora pretende pedir para que a classificação etária seja alterada de 16 para 18 anos.

domingo, 15 de janeiro de 2012

Minha Copacabana

Esta ligeira crônica foi escrita para aula no curso de pós-graduação em Jornalismo Cultural na UERJ em 19/04/10. Fiz poucas alterações; as principais sendo o título (originalmente era "Copacabana vive") e uma menção a meus hábitos como fumante (em pausa desde 14 de outubro de 2011).



Copacabana nunca morrerá. Ela ostenta as marcas do tempo, como uma senhora de vida bem vivida, em que cores e cavidades do rosto e corpo denunciam um espírito que se recusa a ceder diante das adversidades. Para Rubem Braga, uma Atlântida tropical, um fantasioso museu aquático de tempos babilônios. Tempos?
Toda noite, vou à janela. Acendo um cigarro e me debruço no peitoril, a atmosfera de bicho inquieto me dominando suavemente como as ondas que arrebentam a poucos metros do prédio. Uma engrenagem de máquina não bem azeitada, mas funcional.
Nos prédios vizinhos, algumas luzes acesas servem de palco para siluetas insones, teatro de sombras! Além do mar; perto, carros de polícia, gatos fornicando, "Mengo!", fogos de artifício e músicas variadas enchem meus ouvidos. Cheiros de comida, lixo, queimado e adocicados xampus.
A mente caminha para mais longe. Sabe que, logo abaixo, nas ruas, a vida segue em todas as suas manifestações. Copacabana respira com o apetite de um rebelde.

sexta-feira, 12 de agosto de 2011

Valeu, Vicente: um relato pessoal do evento "Homenagem ao querido Vicente"


Ontem eu fui ao Empório.
Para aqueles que eventualmente desconheçam a Zona Sul carioca, trata-se de um bar em Ipanema. Reduto notório de jovens, turistas e criaturas da noite, é conhecido pelo som (rock n'roll) e como porto seguro para os boêmios de plantão (eu). Entre as diversas figuras que estiveram ou ainda surgem por lá, uma resumia em si toda a essência do local. Vicente. Por 22 anos, ele trabalhou como garçom do Empório e se tornou um "embaixador" do lugar. Ele era o Empório em qualidades e defeitos (Quem nunca recebeu seus "avisos" de que não pode entrar com lata de cerveja no estabelecimento ou que é proibido fumar dentro do bar?). Ele morreu na terça-feira, dia 09 de agosto de 2011. Dois dias depois, foi organizada uma homenagem a ele na sua "casa".
Uma amiga, Tábata, teve a ideia e a colocou na rede social. O que, nas palavras dela, seria um encontro entre poucos amigos se transformou numa convocação informal. Chegou a ponto de ela dar uma entrevista para "O Globo" e de receber reclamações de moradores, temendo a movimentação prometida. Deviam ter pensando ser uma espécie de versão carioca para as manifestações londrinas e chilenas, especulo. Pouco mais de 2.500 pessoas confirmaram presença. Duvido que vieram todos. Mas estava bem cheio. Dentro e fora do Empório e estendendo até o bar na outra ponta do quarteirão, o que tinha era gente vinda para a "Homenagem ao querido Vicente". Estacionados na esquina próxima ao bar, a Guarda Municipal tomou posição para acertar a passagem dos carros na rua lotada por pessoas que iam e vinham, cerveja numa mão e cigarro na outra.



Para uma ocasião marcada por uma égide trágica, foi bem descontraído. Lembrava o Empório como ficou marcado em nós: cheio, boa música e amigos aparecendo a cada instante. Era mais o Empório que gostamos de recordar do que aquele que realmente foi. Comentando com Tábata hoje, concordamos que Vicente teria aprovado. Até os reconhecidos pontos negativos estiveram presentes, como a quase total incapacidade de se mover dentro do lugar, a fila do banheiro e o preço do chopp. No entanto, me dando ao direito de ser piegas, senti falta do famoso grito de "Olha o chope!" sempre que Vicente saia do balcão para servir uma mesa. Foi aí que me bateu a certeza de que, como mencionou Bob Dylan numa canção, "Things have changed".
Conversando com alguns dos vários conhecidos em que esbarrei nesta noite, chegamos a conclusão de que o Empório tem duas fases na sua vida: aquela em que as pessoas vão para o Empório e a posterior, em que você aparece no lugar. Explico: a primeira é quando a ida ao estabelecimento é programada. Você combina com os amigos de se encontrar no Empório e a noite gira a partir daí. A segunda é quando, após os bares de rua fecharem, a busca por alternativas de lugares abertos termina por levar ao Empório. Quando você chega a esta fase, é porque não é mais adolescente. Quando começamos a ir ao bar, estávamos entrando na faculdade e não tínhamos maior preocupação do que o CR. Agora voltamos como seres lutando por um quinhão no latifúndio conhecido como mercado de trabalho, com contas e responsabilidades a galope. Definitivamente, não sou o garoto de 20 anos de 2003, ano que marca minha associação com o lugar.
Apesar de, nos últimos anos, somente aparecer de forma ocasional, ainda gosto de lá. Entre porres, tocos e infinitas saideiras, o Empório me parecia um porto seguro justamente por sua atmosfera familiar. E atribuo a isso à presença do Vicente. Até no visual, ele parecia ser o único de nós não afetado pelo tempo. Mantinha a mesma barba generosa e atitude. Gostava de programas culturais e música rock. Sei do primeiro por relatos e experiência. Toda vez que o via, conversávamos sobre filmes, ainda mais depois que me tornei crítico de cinema. Em seguida, pegava com ele um chopp e ia fumar no lado de fora. Quanto ao segundo, há uma gravação no Youtube de um show do Gogol Bordello, em que Eugene Hütz faz um cover de "I wanna be your dog" do Iggy Pop. A participação de Vicente é pequena, porém emblemática.
Como ícone de um passado recente, o falecimento de Vicente deixa uma sensação amarga. Se não para o mundo, sua morte, para mim, separa de forma explícita quem eu fui e o que sou agora. As coisas mudaram. Faço, então, minha despedida usual, quando deixava o copo vazio no balcão e encerrava o dia.
"Valeu, Vicente."

Links:
Eugene Hütz canta "I wanna be your dog"

Morre Vicente, garçom-ícone da cena alternativa carioca, e frequentadores programam homenagem

Foto do evento "Homenagem ao querido Vicente" tirada por... mim.

segunda-feira, 1 de agosto de 2011

Clube da Leitura: Peito


Texto escrito para o evento "Clube da Leitura" no sebo Baratos da Ribeiro, em Copacabana (19/07/11). Visite o blog do "Clube da Leitura". É só clicar no nome.

Tentava pensar em uma ideia para o desafio do dia seguinte: escrever um conto inspirado em uma crônica lida há duas semanas. O mote era uma relato breve em que um acadêmico paulistano comparava o movimento politicamente correto com a transformação do protagonista de “A metamorfose” em um inseto. No caso, como a opção por aceitar passivamente as circunstâncias e nada fazer a respeito pode ser visto por algumas pessoas como uma espécie de felicidade. Ou seja, ignorar o estranho e escolher uma adaptação hipócrita seria a melhor maneira de adequação à sociedade.

Estava num ônibus. Voltava para casa após um longo dia de trabalho. Queria tomar um banho quente e fechar a segunda-feira. A linha era o 308, anteriormente conhecido como 175. Por que mudaram o número, eu não sei, pois o trajeto continuava o mesmo. O que também permanecia era o característico fedor de cecê impregnado pelo veículo como uma lembrança de como as pessoas preferem se manter quietas perante o absurdo a assumir uma postura controvertida e solitária. Puxa, que cheiro terrível; não podia ser o único incomodado.

Entre o cansaço e o odor, nada me vinha à mente. Nada, além das preocupações habituais com desemprego, contas atrasadas e indecisão geral quanto à vida. Então, elas entraram.

Duas garotas, provavelmente retornando ao lar após um dia de trabalho. Poderiam ser estagiárias de uma firma na Barra, quem sabe? Sabia que eram de estatura mediana e muito magras. Jovens, sem dúvidas. Bonitas, num jeito peculiar, também. Achava graça em notar como suas cabeças pareciam grandes demais para aqueles corpos miúdos. Ainda assim, seus rostos cansados e oleosos mostravam uma beleza tímida e nova, típica da garota que lhe conquista com um sorriso e um jeito agradável de ser. Foi aí que percebi outra coisa.
Como todo homem solteiro, olhar de forma discreta não é um crime. Eu olho, tu olhas, ele/ela olha, nós olhamos, eles olham (ninguém mais usa a segunda pessoa do plural “vós”). E o que olhei era que uma delas não tinha bunda. Era realmente sem curvas o trecho de trás da calça abaixo da cintura. Levantei meus olhos e notei que seu decote tampouco era generoso e o de sua amiga também. Ambos eram desprovidos de quaisquer contornos entre o plexo e o pescoço. Logo, não era um vestígio rotineiro de luxúria que conduzia meus pensamentos, mas como as mulheres que haviam feito parte de minha vida se relacionavam com seus corpos.

Independentemente do tipo de relação, todas sempre mencionam um defeito que enxergavam como aberrante. Em geral, esses “erros de nascimento” se concentravam nas partes extremas dos terços que dividem o corpo: pés, bunda e seios. Uma mencionava que tinha o segundo dedo pé muito comprido em relação aos outros e outras que calçavam tamanhos que seriam mais apropriados para um homem. Quanto à parte traseira, surpreendentemente só conseguia me lembrar de uma única queixa: não ter parte traseira substancial. Se o adjetivo deveria ser entendido como algo que mostrasse curvas ou “bumbum de passista”, me falha o entendimento.

Já os seios eram a área mais crítica. As reclamações variavam: muito pequenos, muito grandes, tamanhos desiguais, caídos, … Elas estavam convencidas de que um homem não poderia deixar de olhar para esses defeitos de maneira imediata. Talvez seja minha ingenuidade, mas realmente nunca prestei atenção em nada disso até elas me chamarem a atenção. E, mesmo assim, eu não dava a mínima. Uma ex-namorada perguntava se deveria fazer uma operação plástica. Quando me lembro, acredito que ela esperava que reafirmasse suas suspeitas e abençoasse o sagrado bisturi. Seu olhar questionava minha sinceridade. Assim, repetia a pergunta mais de vez, me encarando na esperança de notar qualquer alteração. Tudo o que queria dizer era que não me apaixonei por uma parte de seu corpo. Quem gosta de pedaços de carne é açougueiro. Desejava que vissem que achar uma pessoa linda não se tratava de imagens, mas de uma experiência sensorial. É preciso tocar algo além da pele.

Embora divague, o ponto que gostaria que ficasse claro é: Homens não se importam tanto como uma mulher aparenta se estão envolvidos emocionalmente. Parece mentira, mas não é. Toda conversa que tenho a respeito de mulheres, após passarmos do cumprimento “é gostosa”, falamos sobre fatores alheios ao visual, como: ela é legal? o que fazem juntos? ela gosta disso, não gosta daquilo? Pelo menos, é assim nos papos em que participei. Há possibilidade de estar sendo ingênuo, mas se elas percebessem que estar com alguém em que podemos nos sentir à vontade, nos sentir com alguém que nos compreende, é o que os homens querem, haveria menos neurose sobre um aspecto que considero trivial. Se homens começam perseguindo a carne, eles ficam pela segurança. Logo, é mais importante ter peito que ser peituda.

Posso soar hipócrita defendendo uma questão mais espiritual que física quando foi justamente a última que me levou a estas reflexões e lembranças. Mas o fato é que isso seria o melhor que conseguiria. Como abordar alguém que você não conhece num ônibus? Não é como num pátio de escola na primeira série quando éramos crianças e tudo surgia sem uma névoa de segundas intenções e desconfianças mútuas. Se pudesse ter uma chance num terreno neutro, como uma celebração, poderia introduzir um assunto. Enquanto isso não ocorre, queria que soubessem o quão bonitas são e que nada ou ninguém poderia tirar isso delas, exceto elas mesmas.

Afinal, o que os homens querem não é um buraco, nem uma paixão alucinada. Tudo isso é bom, não entenda errado. Mas, ao final das contas, o que todos querem é encostar a cabeça no ombro de uma pessoa querida após um dia cansativa e ouvir aquilo que nos mantém seguindo em frente: “Meu amor, eu acredito em você.” Pois estas palavras provam que ainda teremos fôlego para lutar contra a passividade que nos transforma em insetos, seres indiferentes sem motivação para valer sua identidade. O que nos evita de sermos baratas felizes e morrer é o fato de que há alguém ao seu lado e para manter essa pessoa, você precisa ter peito.

Obs: A imagem foi colhida por Ágata Sousa no site PostSecret.

sábado, 30 de julho de 2011

Um debate brasileiro


Você vai se lembrar de mim na semana que vem?

Este texto não pretende discutir os méritos ou a ausência dos mesmos no longa-metragem "A serbian film - terror sem limites". Tampouco é minha intenção questionar se a controvérsia envolvendo sua exibição em território brasileiro seria um caso de censura. Há textos muito bons tratando desses temas e aconselho a leitura. Abaixo, o leitor poderá encontrar os links daqueles que achei mais intrigantes até esta tarde de sábado.
O que me interessa aqui é um elemento indireto na discussão toda. A necessidade de discutir os direitos e deveres da democracia de forma constante. Por que apenas quando um caso desses surge relembramos de nossos direitos? É como se a democracia fosse o ar que respiramos: algo presente, mas que ninguém pensa a respeito. No entanto, quando ficamos sufocados, a necessidade por fôlego retorna. A democracia para alguns parece adquirir uma conotação similar. Só invocamos seu santo nome quando sentimos sua falta. Não discutimos com constância o sistema de governo que foi inexistente por duas décadas e objeto de uma votação nos anos 90 em nosso país. Queremos nossos direitos, mas quase nunca nos damos conta de nossos deveres.
Antes da polêmica da semana passada, um jornal de renome foi proibido de publicar reportagens sobre uma investigação envolvendo um determinado político. Isso foi em 2009. Se me lembro corretamente, houve protestos de diversos membros da fatia intelectual/cultural do país. O site da publicação, inclusive, expunha um banner que servia de faixa de luto com o dizeres "X dias de censura". No momento, me falha a memória que desfecho teve essa história, se é houve algum.
Fatos como esses ocorrem com frequência em nossa nação. O fato é que quando uma proibição é sustentada pela Justiça, essa cumpre um direito de todo cidadão, seja ele um indivíduo ou grupo: aquele que se sentir ofendido por uma insinuação ou campanha pode levar sua queixa ao tribunal e ter seu pedido julgado. Se for procedente, será atendido. Outros julgamentos serão feitos para determinar a validade da decisão. Esse é um princípio e direito democrático. E, nosso dever como cidadãos, aqueles que elegem os funcionários públicos que determinarão os juízes responsáveis por este tipo de decisão acima, é aceitar o verídico caso não caiba mais recurso. Vamos nos lembrar sempre que nós somos parte da corrente dentro deste organismo. Protestos são benvindos e necessários. Entretanto, de pouco adiantam se não nos damos ao trabalho de supervisionar o trabalho de quem votamos até que algo que nos desagrade aconteça.
Temos o direito de nos queixar e exigir na Justiça o que acreditamos ser correto. Por outro lado, um pedido vindo de um partido político e seu cacique é julgado com os mesmos critérios disponibilizados a um indivíduo anônimo? Por mais absurdo que um argumento possa soar, ele merece ser ouvido? São perguntas importantes e negligenciadas. A meu ver, se for justo, deve ser acatado. Caso contrário, combatido. Os tribunais tomam estas decisões. No entanto, sem querer entrar nas particularidades presentes na formulações das sentenças, podemos nos ater um fator simples. Juízes são humanos. Seres humanos erram. Se estes homens e mulheres que foram colocados para fazer cumprir as leis dentro da comunidade cometerem um ato considerado em desacordo com sua posição, a sociedade deve manifestar sua insatisfação. Mas isto não se resolverá com uma solitária reunião em frente a um cinema ou colunas para encher as páginas de publicação impressas ou virtuais da semana. É um processo contínuo. Se você realmente acredita no que defende, precisa ter isso em mente. Só assim sua ideia será ouvida e não largada em meio a todos os gritos do dia. Se você se queixa durante a semana que o filme foi censurado, mas, logo em seguida, está discutindo com igual interesse sobre a última indiscrição de uma celebridade, tem algo errado.
A democracia em nosso país é um bem pelo qual pessoas morreram. Não é melodrama da novela, é verdade. Há pouco mais de 30 anos, brasileiros lutaram de todas as formas possíveis para garantir os direitos que usufruímos agora. Alguns partiram para o exílio, outros desta para melhor. Na época, o inimigo tinha uma face. Hoje, especialmente para as gerações que cresceram no luxo de não ter vivido esta época e passado por estas escolhas, o sentido de esforço contínuo parece ter se perdido. Pior: a indiferença com o que acontece ao seu redor, exceto quando lhe afeta diretamente, se torna a regra. É estranho.
O resumo é que não adianta reclamar que a merda fede depois que está feita. O tipo de comportamento exibido nos fóruns de redes sociais e em mesas de bares durante os 5 dias que durou a discussão deve ser uma constante, não a controvérsia da semana. Mais do que isso até: precisa sair do terreno das ideias e começar a gerar ações. Democracia é composto por direitos e deveres. Em iguais proporções.

Links:
http://cinema.cineclick.uol.com.br/noticia/carregar/titulo/censurado-no-rio-a-serbian-film-e-temporariamente-suspenso-no-resto-do-pais/id/31181/

http://en.wikipedia.org/wiki/A_Serbian_Film

http://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/951320-veto-a-serbian-film-no-rio-revela-conflito-juridico.shtml

http://oglobo.globo.com/cultura/mat/2011/07/26/suspenso-pela-justica-do-rio-filme-com-cenas-de-violencia-explicita-vira-hit-na-web-gera-debate-sobre-censura-924981409.asp

http://g1.globo.com/platb/maquinadeescrever/2011/07/26/um-filme-degradante-e-uma-falsa-polemica/

http://quadrisonico.wordpress.com/2011/07/29/a-serbian-film-censurado-no-brasil-todo/

http://oglobo.globo.com/opiniao/mat/2011/07/27/andre-miranda-924989187.asp

http://cinema.uol.com.br/ultnot/2011/07/22/bem-dirigido-filme-vetado-no-em-festival-no-rio-de-janeiro-e-calculado-para-causar-polemica.jhtm

http://oglobo.globo.com/blogs/prosa/posts/2011/07/30/arte-democracia-a-censura-a-serbian-film-395352.asp

sábado, 23 de julho de 2011

Crônica de uma morte cantada



"I cheated myself
Like I knew I would
I told you I was trouble
You know that I'm no good"

"You know I'm no good" - Amy Winehouse

Um dos maiores sucessos da cantora Amy Winehouse é "You know I'm no good", cujo refrão que ganhou um conotação macabra hoje. Neste sábado, a jovem considerada uma das grandes revelações musicais da década passada, foi encontrada morta. Como nos casos de outros ícones como Jim Morrison, Jimi Hendrix, Kurt Cobain e Janis Joplin, se trata de uma artista talentosa cuja decadência física/psicológica/espiritual atingiu seu ápice aos 27 anos.
A expectativa por seus shows ou novas canções era quase tão grande quanto qual seria a nova merda que faria. Onde ela cairia bêbada desta vez? Que show ela cancelaria por não estar em condições de subir ao palco? Quando ela entraria na reabilitação pela enésima vez? Nós alimentamos o mito da celebridade autodestrutiva. Chamamos de "atitude". Quando ela cobra seu preço, lamentamos a perda. Ainda assim, aplaudimos enquanto assistíamos ao inevitável.
Lembro-me que de conversar com amigos quando ela fez a controversa apresentação no Rio de Janeiro. Um dos comentários mais comuns era o fato de ela viver um estilo de vida extremo e não esconder de ninguém. Numa hipocrisia disfarçada de elogio, Amy Winehouse era praticamente nosso bode expiatório. Ela não era apenas uma pessoa de talento e carisma. Era alguém que vivia por nós as fantasias da existência de celebridade, aquela que poderia agir sem limites e não ser cobrada por isso.
O mito em torno de Amy Winehouse só tende a solidificar no decorrer dos anos. Não apenas por conta do pontos abordados por acima, mas por uma trivia mórbida: em mais de uma ocasião, ela cantou a própria morte. Além do trecho de "You know I'm no good", podemos encontrar outros exemplos nos hits "Back to black" e "Rehab". Numa, ela canta sobre morrer cem vezes e de ser uma pequena moeda rolando dentro de um cano que seria a vida. E, claro, o famoso refrão de "Rehab". Posso ser acusado de tirar as palavras do contexto, mas não acho que seja o caso. Ela cantou e viveu o desespero de uma existência com prazo de validade estipulado. Cantamos de volta, acendendo e balançando celulares.
Alguns podem argumentar que ela se matou. Outros que nós a matamos, ao incentivar a figura pública no lugar da artista. Nunca é tão simples. Há mais fatores que jamais saberemos. Entretanto, não deixa de me espantar a expectativa que havia em torno de sua morte. Acredito que todos podemos nos lembrar de uma conversa ou manchete em que a decadência de seu estado de saúde era motivo de comentários no sentido "até quando vai durar?"
Quando comecei a procurar informações a respeito do ocorrido, esbarrei no site com sugestivo nome de "When will Amy Winehouse die". Nele, os internautas apostavam quando ela bateria as botas. É provavelmente uma das iniciativas de maior mau gosto e condenáveis que tomei conhecimento recentemente. Porque a questão não é quando a drogada famosa vai finalmente se foder, mas quando uma jovem irá morrer/se matar. É assustador perceber que havia uma expectativa maior pela morte que pela recuperação. Mesmo seus fãs não acreditavam que isso fosse possível. Por que ela morreu? Duvido que alguém saiba ao final. O fato é que a novela acabou. Por que não estamos satisfeitos?
Há pouco menos de 20 anos, Kurt Cobain, um artista com estilo de vida e angst existencial similares, se suicidou. Jim Morrison, mesma coisa, duas décadas antes do vocalista do Nirvana. Agora, Amy Winehouse. A diferença está no estilo musical de cada um. O fato é que, num período de tempo aproximado, surgirá alguém que será sacrificado em nome de algo que não é arte. Alguém que será a manifestação carnal de nossas angústias e aspirações. E, por isso, terá um final breve.
Não a conheci, sequer estive presente durante sua performance na minha cidade. Não me lamento por nenhum dos dois. Acho simplesmente triste, porque desperdício me irrita. Por mais que não seja um fã, ela tinha uma voz e coisas a dizer. Suas letras são simples, diretas e honestas. Sua presença era forte mesmo em imagens gravadas. Poderia ter seguido uma carreira como dos grandes nomes de R&B e soul. Morre a diva, fica a lenda.
Não digo que o público matou Amy Winehouse. Apenas que não a ajudou.