sábado, 25 de dezembro de 2010

Papai Noel Rosa



Este texto foi escrito originalmente num bar no Humaitá no dia 22 de dezembro de 2010 para o CEP 20000, cujo tema foi o centenário de Noel Rosa.

Um grande amor tem sempre um triste fim. Com Papai Noel Rosa aconteceu assim. Distribuindo presentes, conheceu esta mulata fuzarqueira; um artigo raro! Foram para o samba, deram rasteira e passaram a noite inteira em claro.
Ano após ano, quando retornava à Vila, suspirava. A estrela da manhã que, quando brilhava na amplidão, o faz lembrar a saudade que guardava no coração. Confessava seu caso de amor para os companheiros, longe da Mamãe Noel Rosa!
O amor cresceu e Papai Noel Rosa só pensava na mulata fuzarqueira. Ela Julieta, ele Romeu. Todo ano, ela perguntava: "Quando vem?" Ele respondia: "Tem amo também." Como se ela fosse mais uma das crianças insistentes, seguia: "Espera mais um ano que eu vou ver. Vou ver o que posso fazer. Não posso resolver nesse momento..."
- Pra quem escreve? - desconfiava Mamãe Noel Rosa.
- Para um cliente que pediu uma viola na última entrega, mas não recebeu, pois não achei o requerimento! - e, suado, completava: (Espera, espera, espera).
Finalmente, numa véspera de Natal, enquanto escolhia com que roupa iria mais tarde para um samba a qual tinha sido convidado, a mulata partiu seu coração. Ele queria discutir, mas ela não queria discussão.
- Da discussão, sai a razão! - argumentou.
- Mas às vezes sai pancada - afirmou decidida.
- A questão é complicada. Quero ver discussão! - implorou.
Mas a mulata já tinha embarcado em outra canoa e andava com um tipo à toa.
Arrasado, pediu para o duende de sua roda realizar as entregas e foi afogar as mágoas no termas. Ficou bêbado e choroso.
- A mulher faz o que quer. Cada qual que cave o seu. Pois o homem já nasceu dando a costela à mulher! - e caía no pranto.
No meio da rua, agarrado à garrafa, o duende o encontrou. Ofereceu o ombro amigo ao colega caído e perguntou:
- Por que bebes tanto assim, rapaz?
- É a mulata...
- Chega, já é demais! Se é por causa de mulher, é bom parar. Porque nenhuma delas sabe amar. Sei que tens em tua vida um enorme sofrimento, mas não penses que a bebida seja medicamento!
Voltaram para a Vila e lá estava Mamãe Noel Rosa. Sentiu o cheiro do esposo e recuou do porre com nojo. Pobre Papai Noel Rosa mal conseguiu articular a defesa:
- Mu... mu... mulher, em mim fi... fizeste um estrago. Eu de nervoso, esto... tou fi... ficando gago!
Apesar de enfurecida, ela o perdoou:
- Por esta vez passa. Por esta vez passa! Mas não volte à minha casa assim cheirando à cachaça!
Quando chegou dezembro de novo, há quase um ano não ia visitá-la no barracão da Penha. Viu o nome da mulata fuzarqueira na lista de boazudas e declarou:
- Nega, nega. Já te dei de tudo. Agora chega!
Papai Noel Rosa, então, partiu, carregando os presentes e a saudade de quem vive sem afago!

Crédito a quem merece: a imagem que ilustra o texto foi retirada do post O centenário de Noel Rosa no site Nada a ver (www.nadaver.com)

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